Álbum ‘Vida Real’ de Ana Cañas. Foto: Fernando Furtado

Em um mercado musical recheado de samples, beats e programações, um álbum mais orgânico é sempre bem vindo. Com instrumentos de cordas e vocais como protagonistas, a versatilidade de Ana Cañas pode ser ouvida em ‘Vida Real’, seu mais novo projeto feito em estúdio, onde a identidade da cantora se torna uma substância marcante em 11 faixas.

Depois de construir uma rede forte de influências, com regravações de Led Zeppelin e Édith Piaf em ‘Volta’ (2012), além da turnê com mais de 180 shows do projeto ‘Ana Cañas Canta Belchior’, a cantora dedicou 14 meses para a produção de seu novo álbum. Cada música apresenta suas referências e temáticas únicas, mas sem fugir da identidade da artista, formando a unidade do álbum. Mesmo com elementos eletrônicos e traços de pop, sertanejo e reggae em algumas faixas, a cara de Ana Cañas fica evidente com o violão, o forte uso de coros e a finalização com notas mais graves no final dos versos, unindo cada track.

Das 10 autorais, três trazem participações de outros artistas. ‘Derreti’, com Ney Matogrosso, e ‘Brigadeiro e Café’, com Ivete Sangalo, parecem ser as apostas para entrar dentro do mainstream pop brasileiro. A parceria com Ney traz uma proposta pop mais sensual, enquanto a faixa com Ivete é aquele já conhecido pop acústico com as palmas no papel das caixas de bateria. Já ‘Amiga, Se Liga’, com Roberta Miranda, traz um feminejo/popnejo interessante com uma conversa do violão, da sanfona e das pontuações do triângulo que se complementam ao temas femininos da letra.

Por falar em letra, é preciso destacar a força e a emoção na composição de ‘Do Lado de Lá’, que por si só já traz um peso e uma reflexão para quem ouve, principalmente para quem já perdeu alguém – seja literalmente ou em qualquer metáfora que preferir. Depois de saber que a letra fala sobre a morte do seu irmão, Leandro Cañas, aos 24 anos, faz todas as características citadas mais presentes e emotivas. O álbum encerra com essa faixa, que é a grande surpresa da produção e evidencia a evolução de Ana como compositora.

Outros destaques de ‘Vida Real’ são: ‘Voa’, que traz a pegada acústica e folk da cantora, com muito violão, baixo e apenas o bumbo da bateria na condução, capaz de ouvir o ‘ploc’ do contato do pedal com a pele do tambor. ‘Quero Um Love’ tem um ar meio reggae, mas que também tem seus sabores pop. Uma mistura interessante. ‘Toda Mulher é Além’ é bem dinâmica, a partir dos 55 segundos, quando a música cresce e o órgão entra trazendo uma textura e rítmica interessante para a balada. Ao final da faixa, a cantora ainda flerta com os solos vocais bastante presentes no R&B e no Soul.

O novo álbum de Ana Cañas entrega um nível de composição compatível com as expectativas impostas sobre sua nova fase, após o término da turnê de Belchior. Em algumas faixas, as expectativas foram superadas. A cantora consegue trazer as temáticas de relacionamento, cotidiano e o feminismo – que faz a ponte com seu trabalho anterior ‘Todxs’ (2018) – sem aquela famosa ‘forçação de barra’. As letras encaixam muito bem na proposta, que se torna unidade com o estilo folk-pop de Cañas.

*coluna ‘Unplugged’, escrita pelo jornalista Luís Guimarães

Luís Guimarães. Foto: Acervo Pessoal

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