Após 5 anos desde o lançamento de “Pausa” (2019), quando o grupo paulistano anunciou o período de hiatus, o 5 a Seco retorna com seu quinto álbum de estúdio, “Sentido”. O disco é marcado pela passagem de tempo desde o último trabalho do quinteto, com cada integrante seguindo seu próprio caminho na vida e na arte. “Sentido” marca uma nova fase do grupo, com 15 novas canções autorais e a participação especial de Chico Buarque na primeira faixa do disco. A variedade de temas dialoga diretamente com o amadurecimento durante a pausa, sem deixar de lado o aspecto principal do 5 a Seco, que se manteve durante os 15 anos do grupo: a harmonia criativa dos cinco. Em entrevista exclusiva para o Anota Bahia, o grupo, formado pelos músicos Leo Bianchini, Pedro Altério, Pedro Viáfora, Tó Brandileone e Vinicius Calderoni, que se revezam durante a apresentação entre os vocais e os instrumentos – todos cantam, tocam e compõem, refletiu sobre a influência do tempo na produção do álbum e dinâmica criativa dos cinco após o hiato, a experiência de ter colaborado com Chico Buarque em “Comédia de Enganos”, e perspectivas para uma possível turnê com passagem por Salvador.
“Sentido” marca o início de um novo momento para vocês como banda. Após um tempo afastados, cada um de vocês passou por experiências individuais. Como essas vivências impactaram a maneira como vocês se reconectaram criativamente como grupo para criar “Sentido”?
Pedro Altério: É muito interessante isso do tempo que a gente passou separado, porque a gente se separa como grupo, mas a gente mantém uma relação muito próxima, muito aproximada, inclusive profissional. Então nesse tempo que a gente ficou parado, a gente trabalhou muito juntos, em setores diferentes, em lugares diferentes. Obviamente que a convivência pessoal e diária cessou, mas a gente continuou. Eu e o Tó produzimos, o Tó e o Vini trabalharam juntos. Eu, o Tó e o Léo trabalhamos juntos, eu e o Pedro temos um projeto juntos, então continuamos fazendo muita coisa juntos. Quando a gente vem e se reúne para fazer o disco assim, são muitas camadas. Eu acho que tem um primeiro lugar que é o desafio de voltar a ser um grupo, voltar a se conectar como uma banda e funcionar como uma banda depois de um funcionamento de cinco anos em um modo mais individual. Apesar de que música se faz em grupo, então mesmo quando a gente está trabalhando individualmente, quando a gente fala de trabalho solo, na verdade é separados uns dos outros aqui, mas trabalhamos em grupo o tempo inteiro no teatro, na música e tal. Tem um desafio de voltar a se conectar e entender esse universo mais paralelo da nossa relação, e se reconectar musicalmente, de uma maneira, acaba sendo uma consequência disso. Então, tem um primeiro desafio, que é pessoal mesmo, e depois a música ela vira um reflexo dessa relação porque no fundo, é isso o que a gente mais preza na história do 5 a Seco, essa relação que a gente tem próximo e a vontade de estar junto fazendo música. Então, na verdade impacta diretamente, a música nada mais é do que um reflexo da nossa relação, condensado ali, inclusive na escolha das canções, é tudo muito coletivo e muito paralelo. Se o 5 a Seco é uma soma de cinco individualidades, tudo que a gente viveu individualmente nesses 5 anos é a matriz é um material nuclear desse disco.
Durante o período de hiato vocês puderam focar em projetos artísticos paralelos, como carreira solo ou em dupla, como a duo dos Pedros. Como essas experiências influenciaram a sonoridade e o processo de composição de “Sentido”?
Vinicius Calderoni: A música que a gente faz tá totalmente entrelaçada com a pessoa que a gente é, com as escolhas que a gente faz, com a vida que a gente leva. O nosso amadurecimento pessoal, o nosso enriquecimento emocional também aparece nos temas que a gente compõe, nas canções, nas coisas que a gente passa a procurar, porque as coisas não são compartimentadas, separadas, no fundo uma coisa reflete na outra. A alimentação da nossa alma, do que a gente vive, também tem a ver com como a gente sintetiza isso na nossa música. A gente volta a cada disco com as nossas bagagens individuais, abre a malinha ali coletivamente e vai descobrindo quais são os pontos de convergência, o que faz sentido falar dentro desse coletivo. Às vezes canções que fazem sentido para os nossos trabalhos individuais, por alguma razão não fazem tanto sentido [dentro do grupo]. Eu acho que a percepção das coisas dentro do 5 a Seco a 5 se dá de uma maneira muito natural, a gente tem esse lugar de mostrar as músicas uns para os outros e pela reação corporal eu sei se os outros estão gostando, se isso está sendo bem acolhido e se está em um lugar de potência coletiva. O que reverbera já é evidente, não é uma coisa cerebral pré-concebida, as coisas que dão certo que tem encaixe, que tem repercussão, elas são visíveis. Isso tem sido uma constante e a essa altura do campeonato, a gente já tem muito mais confiança nesse processo, porque vale outros discos assim, já tendo vivido outros processos, esse foi mais um reforço de que esse modus operandi funciona, embora a gente estivesse há cinco anos afastado.
O novo álbum traz uma sensação de reconexão com o passado do grupo, mas também marca um novo momento. Quais aspectos da identidade musical do “5 a Seco” vocês quiseram manter e o que se pode esperar de diferente nesse trabalho em relação aos anteriores?
Pedro Altério: É difícil de fazer essa medida de quais as características que são mantidas e quais são diferentes. A gente está num processo em que tudo que o público escuta é o nosso ontem, a nossa cabeça e a nossa maneira de pensar a música está sempre um passo à frente do que a do que as pessoas estão ouvindo. As pessoas vão ouvir no dia 28 uma coisa que já é um passado para a gente. Recente, mas que já tá muito introjetado na nossa cabeça. É muito difícil de fazer essa medida no momento em que você tá fazendo as coisas, depois que o disco tá pronto, beleza, a gente consegue colocar um olhar de fora e falar se certas características ainda permanecem aqui. Essa coisa da gente cantar junto, a gente cantar em coro, esse equilíbrio, a diversidade, eu acho que são coisas que se repetem. Mesmo a diversidade é muito diferente dos outros discos, porque são músicas em outro momento cantado por pessoas 5 anos depois. É muito subjetivo isso, mas para mim a principal característica que se repete nesse processo do 5 a seco, é o lance de sermos cinco individualidades caminhando um pouco para lugares diferentes, mirando em lugares diferentes e chegando no mesmo lugar. Se nós cinco estivermos de frente a uma paisagem, por exemplo, todo mundo fecha o olho e nós cinco abrimos o olho durante três, quatro segundos, se fecharmos o olho novamente e pedirem para gente descrever o que vimos, provavelmente a gente vai descrever a mesma paisagem, provavelmente vamos usar palavras e perceber coisas diferentes, mas a paisagem é a mesma. Eu acho que tem um pouco isso 5 a Seco. A gente está olhando pro mesmo lugar, enxergando coisas diferentes, e essas diferenças completam uma imagem que é o disco do 5 a Seco. O que se mantém igual é o processo, essa relação com o momento, acreditar naquele momento e nas tentações que aparecem no momento quando as músicas estão sendo criadas. A gente vai sentindo de maneira meio subjetiva, porque são cinco pessoas pensando muito diferente, e encontrando nessas diferenças o que converge entre a gente, e essa convergência é o que fica. O que acontece dentro da carreira e da história do 5 a Seco em relação a absolutamente tudo, músicas, arranjos, projetos gráficos, tudo, nem tudo vai ser uma unanimidade, é quase impossível isso dentro de um grupo de cinco pessoas muito criativas. Tudo que sai da gente como um grupo é uma convergência daquilo que acreditamos, principalmente na mensagem principal, que é o encontro, esse lugar paralelo, em linha, onde a gente tem essa relação que se reflete muito nos shows, nas músicas e nos discos. Esse equilíbrio paralelo que tem no coletivo, que é uma coisa que a gente preza muito, mais até do que o arranjo e do que a música em si. A música é uma consequência desse encontro e desse arranjo de vidas pessoais e bonitas que a gente tem, essa relação que a gente tem.
A parceria com Chico Buarque certamente é um ponto alto do álbum. O que levou vocês a escolherem “Comédia de Enganos” para essa colaboração e como foi trabalhar com Chico durante a produção da faixa?
Vinicius Calderoni: Essa música foi originalmente composta para uma peça que eu escrevi e dirigi em 2022, chamada Museu Nacional – Todas As Vozes do Fogo. Ela é uma música que tinha uma força na peça e que eu passei a cantar em um show meu em dupla com Ricardo do Teté, que é um parceiro também. E aí, o Tó viu esse show e achou que essa música tinha muita força para poder ser uma música que todos nós cantássemos no disco do 5 a Seco, porque desde o “Pausa” a gente tem uma decisão de a cada disco ter uma canção que nós cinco cantamos. Essa música tem três estrofes, ela repetida são seis estrofes. A gente falou: bom, vamos gravar de modo que cada um canta uma estrofe e a última canta todo mundo junto. Entramos em estúdio já no processo do disco, fizemos um arranjo, levantamos, gravamos e a música estava pronta. Em um belo dia, eu estava aqui em casa, já tendo gravado e ouvindo a música. Quando eu ouvi a última estrofe me deu um estalo de querer chamar o Chico. A gente sempre achou, desde que a música foi composta na peça, que ela era uma música do “universo buarqueano”, em termos estilísticos. Foi uma coisa que eu contei para todo mundo, e todo mundo ficou dizendo que era loucura isso, inacessível, impossível, mas ao mesmo tempo falaram, “Bom, se acontecesse, seria maravilhoso”, e aí fomos tentando por vários caminhos e nada dando certo. Até que a gente conseguiu efetivamente um contato direto por e-mail e o Chico foi muito generoso, receptivo, aberto e aceitou prontamente o convite, que já era bem excêntrico e específico para ele cantar essa última estrofe, porque a gente sentia que esse texto ser dito por ele faria ainda mais sentido. Foi maravilhoso [o dia no estúdio], a partir daí foi só felicidade e teve efetivamente o dia da gravação, que realmente é um dia histórico para a gente.
Tó Brandileone: Não dá nem para chamar de um dia histórico, são 45 minutos históricos, porque foi o tempo que a gente ficou no estúdio com ele e pareceu 45 segundos porque o Chico é parte fundadora do que a gente faz, alicerce das nossas músicas e da música brasileira de maneira geral. Ele foi incrível, chegou sabendo a música, sabendo a melodia, sabendo a letra. Foram 45 minutos mágicos da gente na presença dele ali no estúdio, vendo ele gravar e ouvindo ele materializar uma coisa que já ressoava nas nossas cabeças. A partir do momento que o Vini deu a ideia do Chico cantar nessa canção ficou meio urgente e incontornável que ele cantasse, também porque a gente começou a ouvir a voz dele dentro das nossas cabeças naquela estrofe da música. Até quando ele terminou de gravar, eu comentei: “Chico, minha sensação é de que sua voz sempre esteve aí, você só veio aqui no estúdio para efetivamente gravar, mas ela sempre esteve aí”.
A apresentação no Festival Coala foi um retorno marcante para o “5 a Seco”. Como vocês estão se preparando para o reencontro com o público em outras cidades? Há planos de turnê para promover o novo álbum? O público de Salvador pode esperar por um show em breve?
Tó Brandileone: Essa é uma parte que a gente vai anunciar em breve, traremos novas notícias logo.
Vinicius Calderoni: Só podemos dizer que amamos Salvador e jamais deixaremos de contemplar Salvador. Sempre que a gente vai se apresentar isso certamente estará nos nossos corações e mentes. A gente sempre foi muito feliz na cidade e pretende continuar sendo por longa data, enfim, é isso que podemos dizer para o momento.
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