Defensora do isolamento social, a baiana Margareth Portela, que é pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), sediada no Rio de Janeiro, é a nossa entrevistada semana. Ela é engenharia biomédica formada pela Universidade Federal da Bahia, doutora pela Universidade da Carolina do Norte e pós doutora pela Universidade da Carolina do Sul e pela Universidade de Leicester no Reino Unido. Em conversa com o Anota Bahia, falou abertamente sobre diversos fatores que circundam a pandemia do Coronavírus no Brasil, além de discorrer sobre o afrouxamento da quarentena, a falta de UTIs, colapso dos hospitais, reconhecimento da profissão e Cloroquina. “O Coronavírus é uma doença altamente contagiosa, da qual cerca de 20% dos infectados vão precisar de cuidados mais complexos, vão utilizar a UTI por um período longo, de 02 a 03 semanas, o que pode gerar um colapso. Parte do problema da COVID-19 está relacionado ao problema do sistema de saúde”, diz a profissional.

“O Brasil tem áreas com altíssima densidade demográfica, como Rio de Janeiro e São Paulo, onde a doença cresce enormemente. Mas, ao mesmo tempo, possuem leitos de UTI instalados e com recursos apropriados. Há áreas no país, contudo, que sofrem vazios assistenciais. Fizemos uma pesquisa que mostra que apenas 10% dos municípios brasileiros têm UTI”, completa ela. Falamos sobre transformar a cultura dos serviços de saúde em prol da qualidade do cuidado e segurança do paciente e ela explica: “No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem sofrido processos de subfinanciamentos, além de problemas gerenciais, como gestão de hospitais sendo tratada a partir de jogos políticos. É preciso profissionalizar a gestão”. Destacamos sobre o papel da Fiocruz em meio à pandemia e Margareth defende a instituição, fazendo um recorte para nosso estado: “Ainda que não existam evidências, estamos em uma corrida com alguns medicamentos e nos estudos em busca da vacina. Os centros regionais da Fiocruz, como o da Bahia, têm feito um trabalho fantástico na atuação contra a COVID-19, em parceria com a Universidade Federal da Bahia. Estamos cumprindo o papel que foi ensinado por Oswaldo Cruz em um contexto de epidemias, com a excelente gestão da presidente Nísia Trindade Lima”, enfatizou.

Quando o assunto é o polêmico uso da Cloroquina no tratamento da doença, Margareth é enfática: “Quando todo mundo se acha no direito de discutir, sem noção do que representa, a defesa de Cloroquina, por exemplo, como se fosse um jogo de futebol, claramente tem algo equivocado. Eu acho que vamos pagar um preço alto por isso”. Perguntamos sobre investimentos na área de pesquisa e o reconhecimento da profissão, ela pontua: “Um depoimento pessoal: estivemos, no último ano e meio, achando que o investimento que fizemos nas nossas vidas passou a não valer, com a sociedade começando a dispensar a ciência. De repente, aconteceu a pandemia. E nós somos movidos por um compromisso e orgulho com o serviço público, que estamos integralmente voltados para esta situação – mesmo os que não permanecem na linha de frente, seguem movidos para dar respostas rápidas à sociedade. O desejo de ajudar é muito grande”, disse, entusiasmada. Por fim, quisemos saber da sua opinião sobre o afrouxamento do isolamento social e muito objetiva e incisiva, ela declara: “É preciso ter muita paciência. Não está na hora. Nossa curva ainda está ascendente, os países que estão começando o afrouxamento já apresentam declínio. E mesmo assim, não é tudo que está sendo aberto nesses países”, finalizou.