Empresário, publicitário e estrategista, o baiano Nizan Guanaes diz que a pandemia do novo coronavírus foi mal conduzida em todo o mundo. De acordo com ele, com a crise de saúde pública e o longo período de isolamento social, “quem não era online teve que ficar”. Em entrevista exclusiva ao A TARDE, Nizan diz que “o papel da imprensa nunca foi tão importante no mundo” e que hoje, com a globalização e as mudanças no mercado publicitário, “se você não tiver estratégia, você fica perdido no digital, na televisão, onde você quiser”. Apaixonado pelo território baiano, o estrategista diz que o estado é o melhor local para se trabalhar em home office e que “a Bahia é um estado global que está preparado para receber o mundo”.
Que avaliação você faz da pandemia e como você vê essa tentativa de politização das vacinas?
Olha, eu não falo de política porque a política divide. E aí o que é que acontece, se eu entro nesse assunto a nossa entrevista acaba aqui, porque as pessoas não vão nem ouvir e nem ler. Então eu prefiro analisar para além da política, e para além da política é o seguinte: eu olho com profunda preocupação e com esperança na expectativa da vacina. Nesse momento eu estou em Trancoso e eu estou fazendo uma campanha forte aqui de televisão e digital para conscientizar as pessoas para que o sul da Bahia não vire um irradiador de problemas. Quer dizer, a gente não quer nem que as pessoas tragam Covid, nem levem Covid. Para isso nós estamos pedindo às pessoas que vêm aqui que elas testem, que elas venham com seu PCR. A pandemia é um fato no mundo inteiro. Ao meu ver, a pandemia foi mal conduzida no mundo inteiro. Quer dizer, não dá para jogar só isso no estado brasileiro. Acho que países como Brasil e Estados Unidos perderam um certo tempo negando o tamanho da crise. A China também fez isso. Então agora vamos nos concentrar nas soluções, porque os problemas povoam o mundo. E eu acho que nisso algumas muito coisas boas, aliás, saíram desse momento horroroso. Um deles foi o tamanho da solidariedade no Brasil e do grande envolvimento das empresas privadas.
Você é um homem criativo e, olhando para 2020 e seus ineditismos, a criatividade aflorou ou foi contida ao longo desse período?
Não, em todas as grandes épocas de problemas do mundo a criatividade aflora. O homem é melhor nos problemas do que na paz, para falar a verdade. Você vê isso nas grandes guerras, muito das coisas que nós temos dos avanços da ciência vieram de coisas que foram inventadas para resolver problemas de guerra. Então eu acho que há uma aceleração enorme, inclusive há um editorial do Economist falando sobre os enormes avanços de ganho de produtividade, uma série de coisas que aconteceram, a transformação… Eu acho que o mundo ele tinha um dever de casa para fazer do ponto de vista online, as empresas ficavam negando o online, o homem muitas vezes tem uma zona de conforto e ele começa a negar aquilo que é iminente. E agora não. Com essa pandemia, quem não era online teve que ficar. É como se o mundo estivesse estagiando no online e agora ele disparou.
A crise gera oportunidades. Na sua avaliação, que oportunidades foram criadas em 2020?
Não tenho dúvida que foram criadas várias oportunidades, dentre elas, o home office. Quando Salvador abrir, eu vou passar algum tempo do meu ano aí e trabalhando com meus clientes. Eu sou uma empresa de estratégia e eu não tenho tanta necessidade de estar in loco. Evidentemente que há horas em que nada vai superar o presencial, mas eu e você estamos conversando aqui de maneira semipresencial. Antigamente, para você fazer uma entrevista comigo, ia ser um perrengue para mim e para você. Hoje não, nós estamos conversando com a mesma empatia e com o mesmo jeito. Esse tipo de coisa liberta uma produtividade absoluta e faz com que a gente tenha possibilidades que a gente não tinha. Por exemplo, se eu dissesse a um cliente que eu ia fazer uma reunião com ele por Zoom, muito possivelmente antes ele ia sentir desprestigiado. Hoje não. É tudo muito mais objetivo. Então o ganho de produtividade, de qualidade de vida e as oportunidades que se abrem são enormes.
Como o brasileiro pode olhar para esse ano de maneira positiva? E como aplicar os acontecimentos de 2020 em 2021?
Eu acho que uma pessoa quando infarta e, como antigamente, abria o tórax, ela sem sombra de dúvida foi salva e, ao mesmo tempo em que houve uma mudança no coração, há mudança na cabeça. Eu acho que se o mundo não compreender isso que aconteceu e não refletir sobre isso, é muita burrice. Eu me lembro que minha mãe quando eu fazia alguma coisa errada me botava de castigo. E me deixava lá meia hora pensando. Eu acho que o mundo, essa força grande do universo, como você quiser chamar, a natureza botou o homem de castigo e falou: acho bom você parar para pensar. Então se nós não estivermos pensando no que é que vai acontecer da gente… Por exemplo, não trabalhar em cooperação, o que é que aconteceu com a saúde pública? Fica claro que nós vamos precisar de uma organização em torno da saúde, a Organização Mundial da Saúde, como era antes a Otan, porque muitos dos problemas que teremos à frente vão ser problemas de saúde pública interligados e derivados de uma sociedade que viaja, interligada. Então não vai ter esse negócio de: ah, está acontecendo um negócio da China e não vai sobrar para a gente. Não, tudo é muito interligado, então as soluções têm que ser interligadas e por cooperação.
Você é um homem que trabalha construindo imagens e auxiliando na construção de reputações. Como você avalia o mercado de publicidade hoje no Brasil?
Eu acho o seguinte, o mercado vai ter que passar por uma profunda transformação. Agora, isso não significa uma questão de problema. Tudo está passando por uma profunda reformulação. Eu falo que tudo que tem “agência” no nome, agência imobiliária, agência de banco, agência de turismo, agência de automóvel… Tudo está em profunda transformação e a agência publicitária não ia ser diferente. Se você me perguntar: ah, Nizan, o negócio vai ficar pior? Não. Eu acho, inclusive, que ele vai ficar melhor. Vai ficar mais moderno, mais veloz, mais atual. Agora, é um momento de inflexão. Tanto que a N Ideias já representa, ao meu ver, uma nova visão sobre o mercado de comunicação. Eu não trabalho com publicidade, eu trabalho com estratégia, mas acho que a publicidade vai rumar muito mais para estratégia do que só para propaganda em si.
Até porque o próprio mercado vem passando por uma transformação muito grande, o digital tem assumido um grau de relevância maior e vai ser a prioridade para os próximos anos com certeza…
Não tenha dúvida. Mas o que acontece é o seguinte: se você não tiver estratégia, você fica perdido no digital, na televisão, onde você quiser. Quer dizer, digital, para mim, é um meio. E também o mindset. Ele é inegável, mas a coisa mais importante hoje em dia, como tem tanta escolha para você falar com o consumidor, se você não tiver uma estratégia clara, você fica perdido. Se ficou muito nessa moda de comunicação 360º, eu não acredito nisso. Ela é ideal? É ideal. Mas o ideal não existe no mundo. Então a maioria das marcas não têm dinheiro para 360º ou não têm vocação 360º ou não têm necessidade ou não têm capacidade de administrar uma plataforma com tantas coisas. Então é melhor você fazer 18ºgraus, 20º graus, 30º graus, 100º graus, do que você tentar 360º e você acabar não sendo nada ou gastando uma fortuna e se perdendo. E é aí que entra a estratégia.
O que esperar de projetos de Nizan para 2021?
Olha, eu acho que além da N Ideias… as pessoas até me perguntam, a Lorena Portela, que é a minha CFO, ela é baiana também, falou: mas Nizan, por que nós estamos anunciando se a empresa está lotada de clientes e não pode pegar? Porque eu preciso que as pessoas conheçam a N Ideias, que saibam o que ela faz, que saibam o porquê eu saí do ABC, que saibam que eu estou numa carreira solo, enfim, que eu quero construir essa marca. É o trabalho que eu faço para os outros, eu vou fazer para mim. Então, esse ano de 2021, eu estou focado em fazer também um triatlo Olímpico, que é 1.500 metros nadando, 40 quilômetros pedalando e 10 quilômetros correndo. Isso me dá energia para continuar cada vez mais me envolvendo com os projetos… Porque meus clientes são grandes, eles são enormes. Você está falando de Itaú, Magalu, JHSF, Febraban, Marfrig, Suzano e Ânima. Então são grandes empresas, grandes desafios, grande responsabilidade. Então você tem que estar com toda a energia. Além disso, eu estou investindo em startups. Essa é uma coisa separada, eu cuido, eu invisto minha liquidez nestas empresas, o que é ótimo porque eu estou aprendendo muito. Então eu invisto em empresas como Dr. Consulta, que não é uma startup, é uma grande realidade, que é uma empresa de clínicas populares em São Paulo de muito sucesso, que agora vai se expandir pelo país. Na Mimo, que é uma empresa de streaming online de vendas online. Eu invisto na Fitolab, que é uma empresa de canabidiol, do uso medicinal da cannabis. Eu invisto na Motu, que é a Localiza das motos. Eu invisto na Tribe que é uma empresa que educa jovens para serem programadores digitais. Enfim, eu invisto numa série de empresas novas e isso me faz aprender com essas empresas todos os dias. Então é uma delícia, isso me anima muito, sabe. Então na realidade eu estou estagiando com esse pessoal. E, fora isso, eu tenho a participação da N Ideias em causas. Eu sou embaixador da Unesco. Eu apoio projetos como o Gerando Falcões e sou apaixonadamente dedicado à casa Santa Terezinha, que é uma casa que foi concebida pela dermatologista Régia Patriota, mas que é um trabalho beneficente da minha família. Donata, eu e meus filhos fomos, com os recursos de nossa família, que colocamos essa casa de pé.
Como você avalia o papel da imprensa, Nizan, e os sucessivos ataques que a imprensa sofre hoje no Brasil?
Olha, eu acho que o papel da imprensa nunca foi tão importante no mundo. E a importância das grandes marcas. Porque hoje em dia é A TARDE, é A Folha, é O Globo que valida a informação. Porque você tem tanta informação que você não sabe direito o que é. Várias vezes ao dia você tem um impulso de achar que determinada coisa aconteceu, aí você para e fala: isso é fake news. Então o papel da imprensa é importante, o papel da imprensa é esse, o papel dos veículos de comunicação e, aliás, eles têm tido um grande papel nessa pandemia, grande. Imagina se não tivesse a imprensa com esse mar de desinformação que tem no Brasil e tem no mundo.
O Grupo A TARDE completou esse ano 108 anos. E, se falando do mercado de comunicação, é um feito para ser comemorado…
Sem sombra de dúvidas. É só você pensar que A Folha vai fazer 100 anos no ano que vem. Então é muito tempo, é uma história de credibilidade ligada com a Bahia, A Tarde faz parte da história da Bahia e vice versa. Então é muito importante ter veículos como A Tarde no Brasil e no mundo.
Para finalizar, como você define sua relação e o seu amor pela Bahia?
Ah, Bahia, eu sempre digo que plano de saúde devia aceitar a Bahia, porque a Bahia fura e bem. Eu chego aqui, rapaz, eu chego baleado. Eu cheguei cheio de afta, porque eu fiquei nervoso que desse certo o negócio da live do Caetano e foi um ano muito difícil para o Brasil, para a gente que tem amigos, uma amiga minha perdeu pai e mãe no mesmo mês. Então é difícil. Isso abala todos nós. A N Ideias foi um sucesso enorme e uma realização, porque eu trabalho muito tranquilo dentro do meu escritório, muito concentrado, eu mesmo faço as coisas… Quer dizer, eu tenho uma realização muito grande. Mas, ao mesmo tempo, foi um ano que tirou da gente as energias que a gente tinha e que a gente não tinha. Eu fiquei seis meses trancado dentro de um lugar. Isso não é fácil de fazer. Então eu vim uma semana antes e foi super acertado porque Donata e eu estamos sozinhos em Trancoso, vamos passar nós dois aqui e a Bahia é uma benção. A Bahia é uma benção. E eu fico aqui batendo nesse assunto de que nós, a Bahia, é um estado global que está pronto e preparado para receber o mundo e que isso é uma vocação que vai dar emprego, fazer nossas empresas crescerem, atrair capital, dar à Bahia a infraestrutura que ela tem… E o trabalho tem sido feito pelo tanto pelo governador (Rui Costa) quanto pelo prefeito (ACM Neto) estão dando base para essa coisa. A Bahia precisa aproveitar o home office. Se existe um lugar beneficiado pelo home office e pelo digital, pode ser a Bahia.