
A desembargadora aposentada e jurista baiana Luislinda Valois, autora da primeira sentença do país contra o racismo, foi a entrevistada da última edição do programa Roda Vida, publicado na última segunda-feira (12). Durante a conversa, ela relembrou o dia que recebeu ameaças de morte após publicar uma sentença que denunciava um caso de racismo sofrido por uma empregada doméstica em supermercado de Salvador. Na situação, a vítima tinha entrado para fazer compras, mas não tinha o dinheiro suficiente para comprar o que desejava e saiu do estabelecimento. Na saída, o segurança pediu para que ele abrisse a bolsa, desconfiado de que ela estava tentando roubar o mercado. A doméstica se recusou a abrir e quando a polícia chegou, ela abriu, e não havia nada na bolsa.
“Ela saiu de lá e foi para o juizado, e eu era titular do juizado de pequenas causas de Piatã, e ela registrou a queixa lá. Na hora do sorteio, porque era eu e uma outra juíza, o processo caiu para mim. Eu sempre fui célere, ninguém quer esperar o seu direto levar dez, vinte, trinta cinquenta anos. E nesse dia eu tive que pedir a segurança policial, porque eu soube que o pessoal estava querendo fazer alguma bobagem lá. Na hora que eu disse ‘vou publicar a sentença’. No dia seguinte, quando eu cheguei em casa, na fresta da porta eu vi um bilhete: ‘Você publicou a sentença, mas de amanhã você não passa’. Ai eu disse ‘pronto, meu Deus do céu’. Eu divorciada, tem o meu filho. Se eu morrer, quem vai criar meu filho?”, expôs Luislinda.
Ainda em meio a todo esse processo e tensão, ela pediu autorização do tribunal para viajar e foi com o filho, no dia seguinte, tirar dinheiro no banco para poder viajar com dinheiro na mão. Dentro do banco, a titular foi vítima de racismo enquanto esperava o filho voltar do caixa: “Daqui a pouco, quando eu vi, três pessoas assim no meu entorno. Ai meu filho disse ‘O que que houve com minha mãe, você tá passando mal?’. E eu disse que não houve nada. ‘E por que que esse povo tá aí todo no seu entorno?’. Aí eu disse ‘Não sei, meu filho’. Aí ele perguntou lá a alguém que disse: ‘É, ela veio, ficou aí sentada, não disse nada, não fez nada. Então nós pensamos que ela veio ajeitar aí para assaltar o banco’. Foi muito dolorido naquela hora, muito mesmo”, relembrou Luislinda.

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