Na última segunda-feira (19), foi inaugurada a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, localizada na Avenida Paralela, em Salvador, destinada aos membros popularmente chamados de mórmons. Em processo de construção desde 2021, a propriedade conta com cerca de 6,4 mil m² de área construída, aproximadamente 4 mil m² de área de preservação ambiental e 8,2 mil m² de paisagismo – de acordo com informações do site da instituição – chamando a atenção da população soteropolitana desde o início das obras.
Divulgada inicialmente como inspirada no estilo Colonial Português, a arquitetura do novo templo vem gerando uma série de repercussões e discussões acerca da sua classificação entre profissionais da área. Pensando nisso, o Anota Bahia conversou com arquitetos e historiadores, que discorreram sobre o estilo Colonial e as inspirações da nova igreja da Av. Paralela.
Logo de início, o arquiteto, escritor e professor da UFBA, Marcio Campos, reforçou que as questões de estilo de arquitetura precisam ser vistas à luz da história da arquitetura. A partir disso, ele contou que, a princípio, a noção de um estilo colonial está restritamente ligado ao período em que o Brasil foi colônia de Portugal.
“Obviamente que não deixa de existir de um dia para o outro em 7 de setembro de 1822. Mas durante o século XIX as transformações na arquitetura foram tão grandes que o que vinha da herança colonial logo deu lugar a uma cultura mais cosmopolita, com influências francesas, inglesas, etc. Surgiram novos materiais e novos edifícios que não existiam antes, como estações de trem”, detalhou.
Marcio ainda explicou que um edifício contemporâneo pode tentar imitar um estilo do passado, mas que em tais situações se usa o prefixo neo, como no neoclássico, neobarroco ou neogótico – foram estilos vigentes no século XIX – que imitavam estilos do passado. “Em Salvador, há vários edifícios do período colonial, como o Solar Ferrão ou o Forte de São Marcelo. Mas o Palácio Rio Branco ou o Palacete do Tira-Chapéu são edifícios ecléticos, nada tem em comum com a arquitetura colonial. Foram construídos há pouco mais de cem anos”, deu como exemplo.
Em relação a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, o professor afirmou que a construção não guarda nenhum traço estilístico do estilo Colonial Português no Brasil. Para ele, as características do colonial não podem serem vistas nem nas proporções, nas relações de cheios e vazios, na espacialidade interna e nem na organização formal.
“Um edifício religioso com espaço central, com uma torre única central não existe na arquitetura colonial no Brasil, por isso não se pode nem chamar de neo-colonial. Este edifício não tem um enquadramento estilístico, algo aliás que não se faz para a arquitetura dos últimos 70 anos”, destacou.
Portanto, para Marcio a igreja é formada de citações de arquiteturas históricas de matriz europeia, sem relação direta com a arquitetura histórica construída no Brasil no período colonial. “Este uso livre de citações da história da arquitetura ocidental, na condição de adornos de fachada, é comum nos estados unidos, e é usado por outras igrejas evangélicas”, completou.
Por sua vez, o historiador, consultor e professor Rafael Dantas afirmou que o novo templo religioso da Av. Paralela tem uma série de referências arquitetônicas, sendo uma grande mistura de estilos. “Ele [o prédio] bebe de alguns elementos neo-coloniais, tem alguns pináculos, tem detalhes na platibanda, alguns adornos, algumas características nas janelas, etc., que bebem de uma referência neo-colonial”, comentou.
No entanto, ele também destaca que a construção apresenta outros elementos que já vão para um ecletismo, ainda mais ao analisar o interior do templo, decoração, lustres e corrimões. “Tem referência de diversos lugares, seja do contexto norte-americano, seja do contexto europeu, referências de lustres já com detalhes do final do século XIX, do início do século XX. Então, na verdade, a construção como um todo é uma grande releitura de templos já da primeira metade do século XX que bebem de diferentes estilos arquitetônicos”, contou.
Diante disso, para Rafael, o mais correto seria classificar que a igreja reúne uma série de elementos arquitetônicos e de influências estilísticas presentes tanto no interior quanto no seu exterior. “Inclusive, tem a presença de vitrais, tem gradis, tem corrimões decorados, etc., coisas que foram inspiração provavelmente do arquiteto responsável”, concluiu. Além disso, ele enxerga uma influência do clássico/neoclássico nos detalhes e lustres inspirados nos Baccarat.
A reportagem do Anota Bahia também entrou em contato com uma arquiteta baiana, que preferiu não ser identificada, para explicar a arquitetura do templo religioso. Durante a conversa, ela contou que o prédio não possui um estilo, sendo um recorte de vários estilos com diversas informações juntas no mesmo projeto.
“Colonial vem do Brasil Colônia, essa é uma mistura que vem de influências do estilo Clássico, por mais que a terminologia colonial as vezes abriga muita coisa. No Brasil Colônia o trabalho era mais em argamassas e madeira, próprio da colônia, que é tudo feito em argamassa em volta do vão”, explicou a arquiteta.
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